Na época de seca, o Professor Ventura, Beto e Cleto resolvem automatizar a irrigação do enorme gramado diante da escola! Um sofisticado sistema de solenoides, controlados por um microprocessador, jogaria água nas plantas e no gramado na hora, e na quantidade certa. No entanto, nem tudo que é bem planejado funciona conforme o esperado, novamente os três se metem numa "bela" encrenca! Veja como tudo ocorreu na estória da Irrigação Automática.

 

- Puxa, como está seco meu belo gramado! E, o jardim então? Por mais que os funcionários com mangueiras tentem, não há como manter as plantas verdes nessa época do ano!

 

A reclamação do diretor da Escola Técnica de Brederópolis não era sem razão: todos  anos, naquela época, chovia pouco, e os poucos funcionários de que a escola dispunha não davam conta de regar o enorme jardim na sua frente, usando simples mangueiras!

 

- A solução é simples: basta automatizar a irrigação! - aconselhou o Secretário, que acompanhava o Diretor.

 

- Automatizar?

 

- Sim, mande instalar aqueles sistemas que fazem jorrar água em todo o jardim ao mesmo tempo, bastando simplesmente abrir um registro! Temos o rio passando no fundo da escola e ele pode fornecer tanta água quanto precisemos! Basta bombear!

 

A idéia do Secretário realmente era boa! O Diretor estava pensando nisso, quando passou perto o Professor Ventura.

 

- Professor Ventura! Que bom estar passando por aqui! Quero sua opinião sobre um problema "técnico"!

 

O Diretor explicou rapidamente a idéia do Secretário de instalar um sistema de irrigação automática nos jardins da escola. Os olhos do Professor brilharam, e ele prontamente apoiou a idéia:

 

- Podemos ir além! Por que não automatizar o sistema com recursos eletrônicos, afinal somos uma escola técnica de eletrônica, mecatrônica e informática?

 

- Sim, mas como? - o Diretor não percebeu como a "velha" eletrônica podia entrar na "estória".

 

- Que tal instalarmos um sistema que seja acionado automaticamente todos os dias no mesmo horário! Um sistema de "timers" acoplado a um microprocessador para controlar  os esguichos, e a bomba de água automatizada: será um ótimo exercício para nossos alunos, pois poderemos colocar em ação diversos circuitos que nós mesmos projetamos! Fará bem também para o "marketing" da escola, atraindo novos alunos.

 

O Diretor aprovou a idéia:

 

- Sim! Serve até de demonstração da habilidade de nossos alunos e Professores, e dá uma idéia do que eles aprendem aqui! Podemos usar o sistema como uma espécie de propaganda do que pode fazer a eletrônica, mecatrônica e a informática, mostrando-o aos vistantes!

 

O sercretário aplaudia e, ali mesmo, o Diretor autorizou o Professor Ventura a coordenar a implantação do sistema automático de irrigação.

 

No laboratório, chamando Beto e Cleto, o Professor começou a trabalhar no projeto. Os dois rapazes deveriam ajudar montando alguns dos automatismos. Circuitos desenvolvidos pelos próprios alunos foram aproveitados para esta finalidade.

 

Feito um esboço do sistema, já era possível saber que tipo de aparelhos seriam usados e como funcionariam. O Professor explicava:

 

- A água será bombeada para um reservatório na parte mais alta do terreno da escola. Será um tanque de 5 mil litros onde colocaremos dois sensores. O primeiro, no nível mais baixo, aciona a bomba quando a água deixa de molhá-lo, o que indica que ele esta vazio. O segundo desliga a bomba quando a água está no nível mais alto. Um sistema de monitoria permanente envia informações a uma central de controle, de modo que podemos saber o nível da caixa daqui mesmo. O sistema é biestável, para que não tenhamos acionamentos intermediários.

 

Beto já trabalhava nos sensores:

 

- Usaremos dois fios descascados como sensores. Quando a água molhar simultaneamente os dois fios a resistência no circuito cai e ele é acionado.

 

Cleto observou:

 

- É bom usarmos baixa tensão nos sensores e isolar muito bem o circuito da rede, pois não ‚ conveniente colocar fios sem isolamento da rede de energia em contacto com água. Segurança é tudo!

 

O Professor passou então ao outro bloco do projeto:

 

- A água será liberada por solenoides que serão acionados por um timer. Podemos aproveitar um circuito sincronizado pela rede de energia que fornece excelente precisão, e programá-lo para que, todos os dias as 5 e meia da tarde, haja a irrigação e isso por 10 minutos! Conversei com o jardineiro e ele acha que esse tempo é suficiente para que tudo seja bem molhado!

- Também, com a pressão que teremos, colocando o reservatório no alto do morro! - Beto tinha razão, pois o desnível era considerável.

 

- Na verdade é importante que tenhamos bastante pressão, para que a água possa borrifar longe e com isso cobrir o máximo de área a partir de cada esguicho: quanto maior a área coberta por cada um, menos esguichos precisaremos!

 

- Certo! - concordou Beto com o Professor Ventura.

 

Em pouco tempo o projeto completo ficou pronto e o Professor Ventura o levou ao Diretor, que aprovou imediatamente. A verba foi liberada e os trabalhos começaram. Ao mesmo tempo que o Professor Ventura, Beto e Cleto trabalhavam no laboratório montando os circuitos, e instalando os fios de controle, diversos operarios cavavam e colocavam grossos canos por todo o jardim. Esguichos eram posicionados e firmemente fixados, mas ficando apenas com uma pequena ponta aparecendo no gramado.

 

- Na parte central colocaremos esguichos maiores e de mais potência que cobrirão uma boa área! Os menores, das laterais, devem ter um padrão de esguicho diferente para não molhar a calçada e com isso os passantes! - o Professor Ventura explicou isso ao Diretor, que fazia uma inspeção, durante a instalação.

 

Os testes de funcionamento foram perfeitos: todos os dias às 5 e meia da tarde o sistema entrava em ação e, ao mesmo tempo que o poderoso esguicho central borrifava grande quantidade de água formando um cone invertido, os laterais formavam leques que cobriam toda a superfície do enorme jardim. Terminado o processo, a bomba entrava em funcionamento automaticamente e enchia a caixa, mesmo que não estivesse completamente vazia. Se durante a irrigação seu nível baixasse além do sensor inferior, então a bomba já seria ativada.

 

- Perfeito! Muito bom! - comentava o Diretor sempre que via o dispositivo em funcionamento. Na verdade, sempre que podia, ele interrompia seu trabalho só para ver o acionamento preciso do sistema do Professor Ventura!... Passadas algumas semanas ele se acostumou e esqueceu completamento o assunto!


Em poucos dias, entretanto, também aconteceram outras coisas na pacata Brederópolis: Os efeitos da irrigação começaram a ser notados não só pelas pessoas que frequentavam a escola, como também por gente importante que passava enventualmente por ali: a primeira dama do munic¡pio, Dona Filomena Bolsogrande, visitando a escola, observou encantada:

 

- Olhe! Como ‚ "verdinho" o jardim da escola! O que o senhor faz para conseguir isso, pois toda a cidade está amarelada, inclusive o parque do lago?

 

E, orgulhosamente, Professor Salgado explicava como o Professor Ventura instalou um sistema de irrigação automática "infalível"! Orgulhoso, o Professor Ventura, ao lado dos dois, apenas ouvia os elogios ao projeto.

- Vou falar com meu marido, Saturnino, para instalar isso nos outros parques da cidade! - foi a reação admirada da senhora.

 

Para quem não sabe, Saturnino Bolsogrande era o "preboste" ou melhor, o prefeito da cidade.

 

Mas, o que ninguém sabia é que dona Filomena tinha outras idéias em relação ao parque verdejante!... Tanto que nem sequer prestou muita atenção nas explicações sobre o princ¡pio de funcionamento da irrigação que o Professor Ventura fez questão de detalhar.

 

- Senhoras, acho que encontrei o lugar ideal para fazermos nosso Encontro Anual Ao Ar Livre! - anunciava a primeira dama na reunião semanal da SBB, Sociedade Beneficente de Brederópolis.

 

- Não pode ser o parque do lago! Está tão "amarelo" por causa da seca! - comentou uma participante. A primeira dama eufórica, anunciou então:

 

- Vamos fazer no gramado do jardim diante da Escola Técnica! Vocês viram como ele está verdejante!

 

Todas concordaram, pois o local havia se tornado muito agradável.

 

A organização do encontro não era difícil, pois era praticamente uma "feira ao livre" onde as senhoras montavam algumas mesinhas no gramado e vendiam doces e salgadinhos caseiros que cada uma preparava. O encontro "social" servia para que elas se divertissem e também arrecadassem fundos para suas obras assistenciais.

 

- Estamos programando para este sábado à tarde quando não há aula.

 

- Vou avisar meu marido, informou a esposa do Diretor da escola, que também participava do grupo.

 

O Professor Salgado, distraído como era, não deu muita atenção à informação de sua esposa, de que o grupo beneficente iria realizar o evento no jardim da escola na tarde de sábado.

 

- Vai ser às 5 horas e esperamos que não chova! Dê uma saidinha e venha comer um "docinho" com a gente!...

 

- Sim, querida! - concordou o Diretor sem sequer erguer os olhos dos papéis que assinava.

 

Não é preciso dizer que o Professor Ventura, desligado para este tipo de coisa, não sabia nada sobre o tal encontro.

 

Na tarde do dia combinado, as primeiras senhoras, vestidas com roupas bastante alegres, pois fazia muito sol e calor começaram a chegar à praça e montar suas mesinhas sob as poucas árvores que produziam boas sombras, e até mesmo um pouco afastadas pois naquele horário o sol já estaria baixo.

 

Dona Filomena estava radiante, saltitando de uma mesinha a outra no verde gramado, e experimentando as guloseimas que haviam trazido.

 

Foi enquanto tudo isso acontecia que o Professor Ventura, que estava no seu laboratório precisou falar com o Diretor na sua sala. Ele tinha o costume de ficar na escola até mais tarde no sábado, mesmo com as aulas terminando ao meio dia. Mas logo que entrou, sua atenção foi chamada pelo que viu através da janela:

 

- É o encontro anual das senhoras!... Alguma dúvida? - perguntou o Diretor, vendo-o assustado.

 

- Sim! Muitas: alguém desligou o sistema automático de irrigação?

 

Os dois então olharam imediatamente para o relógio da parede da sala do Diretor: 5 e 30!

 

- Caramba! - exclamou o Diretor, levantando-se da cadeira e batendo a mão na cabeça, reconhecendo o esquecimento.

 

- Chiiii!... Tem que dar tempo! - Exclamou o Professor Ventura.

 

Os dois saíram correndo da sala em direção à caixa de controle que ficava na beira do parque, mas não deu!...

 

Ainda na escada da porta principal da escola os dois observaram, apavorados, quando o potente borrifo central de água subiu com toda sua força, justamente por baixo do vestido da primeira dama que passava no local, elevando-a alguns centímetros do solo! A gorda dama "inchou" com a pressão da água, e pelos pequenos furos dos bordados do vestido podiam ser vistos inúmeros jatos de água!

 

- Parecia que tinham furado uma abóbora com uma agulha de tricô e depois, enfiado uma mangueira d'água! - alguém comentou depois.

 

O fluxo de água, que inchava o vestido da mulher, era tão grande que algumas pessoas dizem até ter visto dois pequenos jatos de água saindo das orelhas da gorda dama! No entanto, ninguém conseguia explicar por onde estava entrando, e consequentemente passando a água que saia daqueles locais! Alguns "engraçadinhos", que souberam do fato, propuseram diversas alternativas, algumas bastante interessantes que envolviam partes "anatômicas" mais íntimas da primeira dama do município!...

 

Não é preciso dizer que todas as outras damas ficaram completamente ensopadas, antes que o Professor e o Diretor chegassem à caixa de controle e desligassem o sistema, mas o estrago estava feito!

 

Nos poucos segundos que a água jorrou muita coisa aconteceu naquele enorme gramado já cheio de gente!

 

Em época de muita seca, insetos e outros animais maiores, que necessitam de muita água e vegetação para sua sobreviviência, se vêem diante de uma situação desesperadora e, saindo em busca do precioso líquido e alimento, começam a se concentrar nos locais em que ele é mais abundante. Não é preciso dizer que a praça diante da escola se tornou um desses locais!

 

Com os jatos de água molhando tudo, muitos desses animais, que estavam escondidos sob folhagens, troncos e plantas saíram, e mais um problema se manifestou:

 

Ainda com a água caindo, uma gorda senhora, sentada no gramado sentiu quando uma "coisa" pegajosa deslizou por entre suas pernas!... Era uma pequena e inofensiva "cobra d'água", não venenosa, mas isso não importava, pois o efeito foi o mesmo que se um brontossauro de 15 toneladas estivesse entrando no estranho local!

 

Jogando a toalha, com que procurava se proteger da água, para cima, a mulher se levantou e começou a pular e gritar, até que a "coisa pegajosa" caiu e rapidamente procurou um abrigo menos hostil!

 

A mulher olhou para a "coisa" que desaparecia na folhagem e desmaiou!

 

Quase ao mesmo tempo, a alguma distância, junto a uma pequena mesa, outro grupo de senhoras procurava se proteger do borrifo, quando um enorme sapo saltou de uma moita e caiu justamente sobre... o bolo que elas vendiam aos pedaços!

 

A debandada foi geral, com gritos para toda parte! Até o sapo debandou, parecendo que estava mais assustado do que todos, diante de tamanha confusão!

 

Uma outra dama que também teve uma "má sorte" no evento que merece ser citada foi a Dona Marieta, uma senhora de seios volumosos, que sempre usava vestidos de largos decotes. Esse costume foi lamentado pela dama por um bom tempo depois do ocorrido!

 

No instante exato em que a água começou a jorrar, um enorme grilo, pretendendo se proteger da "chuva" que caia, viu no decote de Dona Marieta o abrigo ideal. Saltou elegantemente e com excelente "pontaria" mergulhou!

 

Tchof!... Encaixando direitinho no alvo, ele causou então mais uma grande confusão!


Pulos, gritos e correria que quase termina em desmaio foi o resultado da intrusão do pequeno inseto que, se soubesse o que iria causar, certamente teria preferido ficar molhado! O problema só foi solucionado quando, com muito custo, conseguiram livrar a senhora do inseto, se bem que dizem que na verdade o problema era oposto: "livrar" o coitado do inseto, da senhora!

 

Festa estragada, todas molhadas e a "moral" da primeira dama ensopada "até os ossos" afetada, alguns desmaios e várias espécies animais abaladas, tanto por perdas diretas como por sustos, não houve alternativa senão terminar tudo! E claro que as damas se retiraram apressadamente, enrolando suas toalhas molhadas, desmontando as mesinhas e carregando sobremesas estragadas, não sem algumas ameaças que atingiram diretamente o Diretor e o Professor Ventura!...

 

Os dois correram assustados para o interior da escola depois disso!

 

- Precisamos reparar o "estrago"! Se não tivermos uma solução rápida acho que não entro em casa hoje! Você viu como minha esposa estava furiosa! - comentou aborrecido o Professor Salgado.

 

- Sim! - concordou o Professor Ventura, mas o quê fazer?

 

- Que tal "patrocinarmos" o encontro delas com um "belo gesto" para as obras assistenciais? - O Professor salgado tinha uma idéia até que interessante: se há algo que pode apaziguar aquelas mulheres, depois do que ocorreu só pode ser algo que contribua pela causa pela qual elas lutam tanto!

 

- Sim ‚ isso mesmo, mas o quê? Uma importância em dinheiro seria ótimo, mas o caixa da escola anda meio "baixo"! - o Professor Ventura tinha razão.

 

- Precisamos encontrar uma alternativa! Deixe-me pensar!

 

- Já sei! - interrompeu o Professor, que sempre foi um homem de muitas idéias.

 

- ?

 

- Dona Filomena se maravilhou com nosso sistema de irrigação, e deve concordar que ele funciona, não é verdade?

 

O Diretor que prestava atenção e concordou.

 

- Até que bem demais!

 

O Professor continuou:

 

- Pois bem, vamos oferecer-lhe a instalação "grátis" na horta comunitária da Associação Beneficente, que fornece alimentos para a creche e o asilo! Eu monto o automatismo, e quem sabe, o prefeito nos fornece uma colaboração com os canos!...

 

- Boa idéia!

 

Com muito jeito, e pedidos de desculpas, os dois convenceram as damas a aceitar a instalação de uma irrigação automática na horta  da associação como "reparo" pelo incidente.

Novamente homens trabalhando, o Professor Ventura, Beto e Cleto instalando os automatismos e no grande dia da inauguração... Terminou a estação seca com uma forte chuva que durou o dia inteiro!...

 

De guarda-chuva, observando aborrecido os esguichos que molhavam as plantas, assim mesmo na hora certa, o Professor comentava com Beto e Cleto:

 

Pensamos em tudo, menos num sensor que desligasse o sistema no dia

que chovesse!

 

Abril 1994