Nas primeiras lições de nosso curso analisamos o circuito básico de um sistema de ignição, mostrando o tipo comum que se baseia exclusivamente na bobina de ignição, platinado, distribuidor e velas. No entanto, a ignição evoluiu, passando a utilizar tecnologias eletrônicas cada vez mais avançadas. É justamente destas ignições que trataremos nesta lição de nosso curso de eletrônica automotiva.

 

Princípio de funcionamento

A finalidade do sistema de ignição, conforme estudamos, é gerar a alta tensão que aplicada às velas provoca a faísca que vai queimar a mistura ar combustível no cilindro de um motor a explosão. O sistema de ignição deve elevar a tensão da bateria de 12 V nos carros atuais para valores entre 15 000 e 60 000 volts dependendo do veículo.

No sistema comum um platinado comuta a corrente do enrolamento primário de um autotransformador denominado bobina de ignição, gerando assim a alta tensão para as velas. No entanto, esta tecnologia foi superada com o advento de dispositivos eletrônicos de comutação como os transistores e os SCRs e de tipos de sensores muito mais eficientes que os platinados, como os denominados sensores Hall e os sensores indutivos. Estes novos dispositivos deram origem a diversos tipos de ignição que passamos a estudar em seguida.

 

Tipos

O tipo mais simples de ignição eletrônica e também a primeira a ser adotada.é a chamada ignição assistida eletronicamente ou simplesmente ignição assistida. Nela, o que temos é simplesmente um transistor de alta potência substituindo o platinado. Na figura 1 temos um circuito deste tipo de ignição.

 

Circuito de ignição.
Circuito de ignição.

 

Nela o transistor estabelece a corrente da bobina quando comandado pelo platinado. As vantagens são muito grandes. A primeira está no fato de que platinado, comandando a corrente de base do transistor, que é muito menor do que a corrente da bobina, não sofre o desgaste comum e é mais eficiente. A outra está no fato de que o transistor comuta a corrente com muito mais velocidade respondendo portanto aos comandos do platinado de forma muito mais eficiente nas altas rotações.

O segundo tipo é a A Ignição por descarga Capacitiva. Na figura 2 temos o diagrama de blocos de um sistema de ignição capacitiva convencional.

 

Diagrama de blocos de um sistema de ignição por descarga capacitiva.
Diagrama de blocos de um sistema de ignição por descarga capacitiva.

 

Na entrada, temos um circuito inversor que eleva os 12 V da bateria do veículo para uma tensão contínua entre 200 e 600 V dependendo do circuito e da aplicação. Normalmente são usados pares de transistores de potência formando osciladores em contra-fase com realimentação direta pelo transformador, ou circuitos com MOSFETs de Potência, ou transistores bipolares, excitados por osciladores com circuitos integrados. Na figura 3 temos uma configuração típica do setor inversor de um sistema de ignição capacitiva convencional.

 

Circuito inversor de uma ignição por descarga capacitiva.
Circuito inversor de uma ignição por descarga capacitiva.

 

Observe que esses transistores trabalham numa condição-limite de corrente e tensão, já que na comutação pulsos de alta tensão são retornados pelos enrolamentos do transformador. Assim, os transistores usados nesses circuitos são normalmente tipos especiais com características de alta corrente e alta tensão. Na prática, por trabalharem nessas condiçõeslimite esses transistores são componentes bastante sujeitos à queimas. A alta tensão gerada pelo inversor é usada para carregar um capacitor.

Esse capacitor entre 470 nF e 4 µF tipicamente determina a “energia” de cada faísca. Em outras palavras, é a energia (em milijoules) armazenada nesse capacitor que vai ser aplicada ao transformador de alta tensão para resultar na faísca.Entra em seguida em jogo, o sistema comutador que deve fazer com que a faísca seja produzida exatamente no instante em que ela é necessária. Esse circuito leva por base um sensor da posição do eixo do motor que pode ser de diversos tipos. Uma possibilidade muito usada é usar um sensor de efeito Hall que nada mais é do que um dispositivo que “sente” a passagem de um imã fixado ao eixo, pelo seu campo magnético, conforme mostra a figura 4.

 

O gerador de pulsos usando um sensor Hall.
O gerador de pulsos usando um sensor Hall.

 

A cada passagem é produzido um pulso de comando que ativa o circuito de controle de produção da faísca. Outra possibilidade, mostrada na figura 5, e também detectada por sensores magnéticos é a que aproveita ressaltos no eixo do motor.

 

Gerador de pulsos usando sensor indutivo (bobina).
Gerador de pulsos usando sensor indutivo (bobina).

 

Quatro ressaltos ou dentes no motor produzem quatro pulsos por volta, num motor de quatro cilindros. Veja que o fato de não haver contactos nesse sistema, sua eficiência e durabilidade são muito maiores. Nos sistemas antigos, com platinados, além da necessidade de troca periódica, pois seus contactos desgastavam-se e queimavam-se, sempre existe o problema da falha mecânica devido a diversos fatores.

Os sinais dos sensores são levados ao bloco comutador propriamente dito que, na maioria das aplicações, consiste num SCR. O SCR forma com o primário da bobina de ignição e o capacitor um circuito fechado, conforme mostra a figura 6.

 

O disparo do SCR provoca a descarga do capacitor.
O disparo do SCR provoca a descarga do capacitor.

 

A cada pulso de comando do sensor o SCR liga provoca a descarga do capacitor através do primário da bobina de ignição, que forma o bloco seguinte. Veja que mesmo trabalhando com altas tensões e uma corrente de descarga intensa, o SCR não é um componente tão crítico nesse tipo de projeto. A bobina de ignição consiste num auto-transformador que gera tensões entre 5 000 e 20 000 volts tipicamente. Nos veículos de competição, essa tensão pode ser ainda maior. O elemento final do circuito é o conjunto de velas onde as faíscas são produzidas.

 

Topologias

Diversas são as possibilidades de se implementar os circuitos dos blocos que mostramos nas aplicações práticas. Assim, na figura 7 mostramos uma topologia para circuito de disparo em que um diodo anti-paralelo com o SCR é acrescentado.

 

Ligação do diodo anti-paralelo.
Ligação do diodo anti-paralelo.

 

A finalidade desse diodo é conduzir os semiciclos negativos que são gerados na comutação quando o campo magnético da bobina se contrai. Nessas condições temos uma corrente no circuito conforme a mostrada na figura 8.

 

Formas amortecidas do sinal na bobina, SCR e no diodo.
Formas amortecidas do sinal na bobina, SCR e no diodo.

 

Uma segunda topologia também encontrada nas aplicações práticas é a mostrada na figura 9 em que o diodo é ligado em paralelo com a bobina.

 

Topologia com diodo em paralelo com a bobina.
Topologia com diodo em paralelo com a bobina.

 

Nesse caso, o diodo produzindo a forma de onda mostrada na figura 10.

 

Forma de onda no circuito.
Forma de onda no circuito.

 

Um circuito quase que completo para um sistema de ignição, como os encontrados em veículos e que faz uso de um sensor magnético (uma bobina) é mostrado na figura 11.

 

Um circuito com um sensor magnético
Um circuito com um sensor magnético

 

A forma de onda produzida pelo sensor e que dispara o circuito é mostrada na figura 12.

 

Forma de onda no sensor de disparo.
Forma de onda no sensor de disparo.

 

Esse circuito pode fazer uso de diodos de 400 V em lugar dos circuitos convencionais que usam diodos de 1 000 V. Nos picos positivos da tensão retificada, o capacitor se carrega.

 

Microcontroladores

Nos veículos modernos o ponto de disparo dos circuitos de ignição não são determinados apenas pela posição do rotor do motor. Outros fatores como a aceleração que está sendo impressa pelo acionamento do pela, a velocidade, a própria inclinação da pista, temperatura do motor, etc. devem ser levados em conta e para essa finalidade existe o microprocessador.

Conforme mostra a figura 13 o controle do sistema de ignição e de injeção de combustíveis estão ligados a um bloco microcontrolado onde os sinais de diversos sensores são responsáveis pelo envio de informações.

 

Diagrama de blocos de um sistema de ignição microcontrolado.
Diagrama de blocos de um sistema de ignição microcontrolado.

 

Mais do que isso, cada vela tem um circuito de disparo independente, o que pode levar a topologias conforme a mostrada na figura 14.

 

Sistema de ignição com circuitos de disparo independentes.
Sistema de ignição com circuitos de disparo independentes.

 

Desempenho

O desempenho dos sistemas de ignição que usam recursos eletrônicos é bem melhor do que as ignições tradicionais baseadas simplesmente em platinados. Temos então as seguintes vantagens:

Na ignição eletrônica, tanto de descarga capacitiva como assistida, obtém-se uma faísca com boa intensidade mesmo nas altas rotações, o que significa que o motor não perde o torque nas altas velocidades, o que ocorre com a ignição comum com platinado.

Na ignição assistida a corrente no platinado é muito baixa e por isso esse elemento não se desgasta com a mesma facilidade que na ignição comum. O problema comum de perda de rendimento devido aos maus contatos no platinado ou ainda a falha de funcionamento quando os contatos “grudam” não existe.

Na ignição por descarga capacitiva não existe platinado e a comutação é eletrônica o que significa a ausência de partes mecânicas que podem falhar.

As ignições eletrônicas não precisam de manutenção, principalmente a por descarga capacitiva que não tem qualquer peça móvel que se desgasta.

Existe uma possibilidade maior de se modificar o ponto de disparo por controle externo nos dois tipos de ignição, o que facilita a implementação dos controles por microcomputador que tornam o desempenho do motor muito melhor, otimizando o gasto de combustível e outros fatores importantes.

 

Diagnóstico e análise

O diagnóstico de problemas nas ignições eletrônicas pode ser feito com a ajuda de instrumentos simples como o multímetro, testando-se componentes e medindo-se tensões.

Em alguns casos, quando os componentes que queimam são transistores de potência e SCRs pode-se até fazer sua troca. Em geral, entretanto, por facilidade e pela própria necessidade de se garantir um funcionamento com mais confiabilidade, em caso de queima, trocase a ignição em sua totalidade, já que na maioria dos casos ela é encerrada em conjuntos que não podem ser abertos e reparados com facilidade.