Escrito por: Luiz Netto

Um cientista cujas descobertas e invenções não foram levadas à devida consideração em seu tempo pela miopia dos governantes e empresários, e que por isso mesmo não teve apoio na dose devida, caso contrário seu nome e sua obra estariam sempre sendo lembradas na proporção de seu mérito e pioneirismo, como soe acontecer com outros países que prestam homenagens aos seus ilustres filhos, não perdendo a oportunidade de lembrar-lhes orgulhosamente os nomes em datas correlatas aos seus feitos, lembrando ao mundo o que fizeram e qual legado deixaram para a humanidade.

ART1665S

Este artigo é de1999

 

1861 – 1928
1861 – 1928

 

 

Quem inventou a telefonia sem fio?

Responde a essa pergunta o próprio Monsenhor Roberto Landell de Moura: " - Os americanos, decorridos os 17 anos de prazo que marca a lei das patentes, puseram em execução prática as minhas teorias. Não sou menos feliz por isso. Eu vi sempre nas minhas descobertas uma dádiva de Deus. E como, além disso, sempre trabalhei para o bem da humanidade, tentando, ao mesmo tempo, provar que religião não é incompatível com a ciência, folgo em ver hoje realizado, na prática utilitária, aquilo que foi o meu sonho de muitos dias, de muitos meses, de muitos anos", (entrevista concedida em 1924, ao jornal de Porto Alegre, Última Hora)

 

Breves Dados Biográficos:

Nasceu o Monsenhor Roberto Landell de Moura no dia 21 de janeiro de 1861, na cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, na Rua Bragança, hoje Marechal Floriano, numa casa que fazia esquina com a antiga Praça do Mercado, tendo sido batizado juntamente com sua irmã Rosa, a 19 de fevereiro de 1863, na Igreja do Rosário, de cuja freguesia, anos mais tarde e até ao falecer viria a ser o vigário. Ele era o quarto de doze irmãos, sendo seus pais o Sr. Inácio José Ferreira de Moura e Dona Sara Mariana Landell de Moura, ambos descendentes de tradicionais famílias sul-rio-grandenses.

Landell de Moura estudou no Colégio dos Jesuítas, em São Leopoldo, onde fez os primeiros estudos. Terminando o Curso de Humanidades, com excepcional brilhantismo, por volta de 1879 transferiu-se o jovem Roberto para a Corte, onde, segundo uns matriculou-se na Escola Politécnica, e segundo outros teria se empregado em um armazém de secos e molhados, como caixeiro de balcão.

Esse pormenor, sem dúvida importante, segundo o pesquisador Ernani Fornari, um de seus mais ilustres biógrafos, não foi possível esclarecer. O que é certo é que ele já se encontrava, havia alguns meses, na Capital do Império, quando seu irmão Guilherme, que ia seguir a carreira eclesiástica, passou pelo Rio de Janeiro, em trânsito para Roma. Essa visita de Guilherme foi decisiva na vida de Roberto. Por influência de seu irmão, Roberto que era dotado de fervoroso espírito místico, decidiu, de repente, abandonar o Comércio (ou a Escola Politécnica) e abraçar o sacerdócio -o que ia de encontro aos desejos de seus pais que sonhavam vê-lo padre.

Roberto seguiu então para Roma em companhia do irmão. Ali ingressou no Colégio Pio-Americano e passou concomitantemente a frequentar a Universidade Gregoriana, na qualidade de aluno de Física e Química, para o estudo de cujas matérias manifestara, desde criança uma pronunciada inclinação.

Segundo seu irmão Guilherme a ciência e a religião teriam falado a Roberto a mesma linguagem sedutora, e que ele não teria ido para Roma se ao lado do Colégio Pio-Americano, não funcionasse a Universidade Gregoriana.

Em Roma, Landell de Moura concebeu as primeiras ideias em torno de sua teoria sobre a "Unidade das forças físicas e a harmonia do Universo". Ordenado sacerdote a 28 de novembro de 1686, e quando estava de volta ao Brasil, quando viajava de Roma para Paris, um fenômeno muito comum que se observava naquela região, durante o estio, veio confirmar-lhe ainda mais fundamente o ponto de vista, que pouco mais tarde, o levaria às suas prodigiosas descobertas e invenções.

Esse fenômeno é o mesmo que se verifica muitas vezes em nosso país, especialmente em nossas cordilheiras, quando o ar, aquecido, parece galopar no espaço, fenômeno esse que também se observa na combustão dos campos. Essas observações levaram Landell em um de seus inventos, patenteado nos Estados Unidos, o Wireless Telephone - Telefone sem fio - a aplicar suas observações qual seja a de produzir variações da intensidade de luz - pela variação das intensidades da voz humana - ou seja modulara luz por meio das variações da intensidade e frequência da voz humana.

Retornando ao Rio de Janeiro, onde logo se espalhou seu nome como físico de valor, foi residir em uma casa de padres então existente no hoje desaparecido Morro do Castelo.

Ali permaneceu por cerca de dois meses, durante os quais, conforme confidenciou, certa ocasião, ao jornalista porto-alegrense Sr. Arquimedes Fortini, nas vezes em que, por motivo de enfermidades do coadjutor do capelão do Paço Imperial, seu amigo, ali servira a pedido deste, mantivera longas palestras de caráter cientifico com

D. Pedro II, que desde 1856 seguia atento o trabalho dos sábios sobre transmissão do som. Depois dessa curta estada na Corte, a 28 de fevereiro de 1887, foi o Padre Landell nomeado capelão do Bomfim e lente de História Universal do Seminário Episcopal de Porto Alegre, cargo esse que desempenhou com invulgar capacidade e eficiência.

Em 1891 foi nomeado vigário paroquial em Uruguaiana, demorando-se menos de um ano naquela cidade fronteiriça, sendo em 1892, transferido para o Estado de São Paulo, tendo passado por várias cidades como Santos, Campinas, Mogi das Cruzes, e em São Paulo, no bairro de Santana, em um período de 7 anos.

Foi em Campinas, nessa época burgo tranquilo e devoto, propício ao estudo e meditação, que Landell de Moura deu forma definitiva às suas teorias, sobre as quais, aliás, não deixara de refletir um único momento. Ali, pois, atirou-se ao trabalho de investigação e apuro. A sua mente arguta e observadora, inspirações generosas aportaram à sua inteligência, como resposta às suas demandas inquiridoras.

 

Revolução no espaço 

Enunciou o seguinte princípio: Todo movimento vibratório que até hoje, como no futuro, pode ser transmitido através de um condutor, poderá ser transmitido através de um FEIXE LUMINOSO; e por esse mesmo fato, poderá ser transmitido sem o concurso desse agente. Estabelecido esse princípio, enunciou o seguinte:

Todo movimento vibratório tende a transmitir-se na razão direta de sua intensidade, constância e uniformidade de seus movimentos ondulatórios, e na razão inversa dos obstáculos que se opuserem à sua marcha e produção.

 

Padre Landell ousou mais. Espírito sempre em busca do mais além, formulou então, audaciosamente o seguinte postulado, que foi talvez, a causa principal de todos os seus sofrimentos, pelo grande escândalo que provocou entre seu inculto rebanho:

Dai-me um movimento vibratório tão extenso quanto a distância que nos separa desses Outros Mundos que rolam sobre nossa cabeça, ou sob nossos pés, e eu farei chegar a minha voz até lá.

Imaginem, um sacerdote - ministro de Deus que declara abertamente sua convicção na pluralidade de mundos habitados com os quais se poderia falar_ Resultado dessa história: -Teve todos os seus aparelhos destruídos por fanáticos que não compreenderam a extensão e a profundidade de seus pensamentos e que certamente o viam como alguém relacionado com as coisas do Demo e não como um santo homem a serviço do Senhor do Universo!

Trabalhando sempre arduamente e com dificuldades de toda ordem, Landell de Moura reconstrói seus aparelhos com seus minguados proventos, já que ele integrava em seu espírito uma multiplicidade de habilidades: Era o Engenheiro Projetista e o esmerado artífice construtor destes. Assim, um dia, vindo de Campinas, surge em São Paulo o Padre Landell de Moura, a sobraçar misteriosos embrulhos que continham as peças de um aparelho por ele inventado e com o qual segundo afirmava - poderia falar com outra pessoa colocada a quilômetros de distância, sem ser necessário o uso de fio algum

Apesar da dúvida com que foi acolhida tal afirmação, houve quem nela acreditasse, em princípio. Interessados, pediram-lhe provas. Deu-as o estranho padre - com seu aparelho ainda rudimentar, realizou várias experiências de transmissão e recepção sem fio da palavra falada, coroadas, todas elas, do mais completo e retumbante êxito. Verificou-se isto entre os anos de 1893 e 1894!

Essas experiências, algumas das quais levadas a efeito com a finalidade de interessar as autoridades e conseguir financiadores para o aperfeiçoamento e exploração industrial de seu invento, tiveram lugar, na capital Paulista, do Alto da Avenida Paulista ao Alto de Santana, numa distância aproximadamente de 8 quilômetros, em linha reta - mais de um ano antes, portanto, da primeira experiência realizada por meio das ondas hertzianas, por Guglielmo Marconi, em Pontequio, perto de Bolonha, na primavera de 1895, o qual tendo conseguido apoio comercial, prosseguiu com a radiotelegrafia que depois o consagraram definitivamente, pela retumbante e ressonante divulgação do S.O.S. do Titatinic em todos os quatro cantos do mundo.

 

Transmisso/Receptor do telefone sem fio
Transmisso/Receptor do telefone sem fio

 

 

Landell de Moura obteve a patente brasileira de seus aparelhos em 9 de março de1901 - Privilégio Industrial n. 2.883 - com aparelho destinado a: "Transmissão fonética à distância, com fio e sem fio, através do espaço, da terra, e do elemento aquoso". - Esses documentos estão registrados no ARQUIVO NACIONAL no Rio de Janeiro.

Consciente do real valor de suas invenções, padre Landell partiu com destino aos Estados Unidos da América, quatro meses depois, com o intuito de patentear seus aparelhos. Com parcos recursos, teve que contar com a ajuda de amigos, como Daniel Tamagno, para levar adiante seu projeto. Apesar de todas as dificuldades que encontrou, Landell de Moura conseguiu três cartas patentes no U.S. Patent Office em Washington -: "Transmissor de Ondas - Wave Transmitter - em 11 de outubro de 1904 - Patente N.771.917 "; "Telefone Sem fio -Wireless Telephone - em 22 de novembro de 1904 - patente n.775.337""Telégrafo sem fio - Wireless Telegraph - também em 22 de novembro de 1904 - Patente N. 775.846".

Ainda naquele ano, ele esboçou outro engenho ligado à vida moderna. Em 20 de Agosto de 1904 um dos documentos que ele batizou de "The Telephotorama" ou "Visão à distância". Tratava-se da Televisão, que só em 1926, teria sua primeira demonstração pública. Infere-se de alguns de seus manuscritos que alguns problemas do vídeo comunicação já tinham sido resolvidos por ele.

Pode, portanto, também ser considerado um precursor dessa invenção ainda que a escassez de documentos não permita saber até que ponto ele chegou nesse projeto.

Alguns documentos deixados por ele foram analisados por técnicos da Telebrás, que chegaram a essa conclusão. Quando Landell retornou dos Estados Unidos com o respaldo de suas patentes norte-americanas em sua bagagem, imaginou que certamente seu destino mudaria. Escreveu ao então Presidente da República, na época Rodrigues Alves, e solicitou dois navios para demonstrar suas invenções. Um assessor do governo o procurou e Landell lhe diz que desejava entre os navios a maior distância possível, e disse mais" Olha, isto agora, porque no futuro, quando eu aperfeiçoar os meus aparelhos, eles servirão até mesmo para COMUNICAÇÕES. INTERPLANETÁRIAS...! " -Não é nem preciso dizer que o tal assessor, correndo os olhos de cima abaixo à esguia figura do padre - e com um olhar de espanto, elabora um pensamento fulminante para as pretensões de Landell, selando-lhe o destino. Ao reportar a conversa que tivera para o Presidente, disse peremptoriamente: Presidente: Esquece o tal Homem. Ele é positivamente louco, imagine que me disse que.... "

E, positivamente o Presidente da República esqueceu-se de Landell de Moura.

Nos dias de hoje contemplando tudo o que acontece no mundo das telecomunicações, vemos que suas palavras não escavavam absolutamente destituídas de fundamento e só uma mente privilegiada e inspirada poderia antever o que estaria por vir, e naturalmente não se poderia exigir muito daquele obscuro assessor governamental.

Landell de Moura, mente brilhante, leve seus interesses intelectuais voltados para outros campos do conhecimento humano.

Foi um investigador infatigável dos fenômenos da vida e da morte, foi um pensador com contínua preocupação com os fenômenos dos mistérios da alma humana.

Preocupou-se com assuntos de Parapsicologia. Desenvolveu uma teoria sobre o Perianto - no qual descreve que "Todo corpo humano está como que envolvido de um elemento de forma vaporosa, mais ou menos densa, segundo a natureza ou estado do indivíduo ou ambiente em que ele se acha. Esse elemento, quando adquire uma tensão capaz de vencer os obstáculos que se opõe à sua expansão, escoa do corpo humano sob a forma de descargas disruptivas ou silenciosas, tal qual como sucede com a eletricidade. E os fenômenos que nestas ocasiões se dão, tem muita analogia com os elétricos estáticos e dinâmicos, com relação aos outros corpos semelhantes".

Padre Landell não ficou só na teoria. Ele conseguiu fotografar o efeito. Ignácio Landell de Moura contou que quando seu tio morreu, achou, nos seus pertences, "uma caixa cheia de coisas e uma porção de chapas fotográficas". Mandou ampliar as chapas e viu "coisas misteriosas", que não soube explicar o que era: A dúvida que fica: nestes filmes estaria registrado o que hoje é conhecido como efeito Kirliam? Ao que tudo indica, sim!

Em 30 de Junho de 1928, sábado, 17 h e 45 minutos, em Porto Alegre, ROBERTO LANDELL DE MOURA, aos 67 anos, abatido pela tuberculose, dá seu último suspiro e deixa este mundo. A estrela passou e deixou a luz de seu esplendor registrado em nossas retinas, a mesma luz que hoje transporta milhares de informações por via das fibras áticas.

Landell de Moura foi um ser inspiradíssirno que viveu adiante de seu tempo. Cabe a cada um de nós que lhe conhece o trabalho, resgatar-lhe o nome e difundir sua obra quando se apresente a oportunidade.

 

Obras consultadas:

 

Diagrama esquemático do Transmissor/Receptor de sinais por ondas curtas e via pulsos de luz intermitente.
Diagrama esquemático do Transmissor/Receptor de sinais por ondas curtas e via pulsos de luz intermitente.