Escrito por: Eltron Shinji e Leonardo Araujo

Prevenção de acidentes por meio de alternativas eletrônicas em escala local

Elton Shinji Okuma Hayachiguti,Leonardo Araujo Lion, Newton C. Braga (Orientador) - Colégio Mater Amabilis, Guarulhos, SP

 

Na troposfera, em dias de céu obscurecido por nuvens densas, estas atritam entre si e geram cargas, podendo ser positivas ou negativas. As cargas se movimentam dentro da nuvem, e quando um excesso de cargas se acumularem, ou a polarização das cargas da nuvem se mostrar forte, pode ocorrer uma descarga elétrica, ou raio. Tal descarga pode ocorrer dentro da nuvem ou numa interação nuvem-terra (na qual o raio pode tanto “subir” ou “descer”) que é decorrente das cargas do solo interagindo com as cargas da nuvem. O estado da nuvem carregada cria um forte campo eletrostático, que fará com que uma enorme quantidade de cargas “siga” a nuvem pelo solo, então permitindo um raio que cai ou parte da terra.

Dadas as cargas que percorrem o solo, aplica-se o efeito das pontas, o qual afirma que quanto menor a área pela qual cargas elétricas se espalharem, maior será a quantidade de cargas nela, ou seja, uma maior densidade elétrica. Assim, quando houver um corpo pontiagudo no solo, as cargas se acumularão em seu cume, o que justifica o fato de os raios caírem em para-raios, postes, ou, acidentalmente, em pessoas.

A partir de dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, INPE, a cada 50 fatalidades causadas por raios no mundo, uma delas ocorre no Brasil. Anualmente, registram-se em nosso país mais de 50 milhões de raios, que, de 2000 a 2014, causaram 1790 acidentes fatais em diversos meios como praias,

zona rural durante atividades agrícolas, campos de futebol e até mesmo dentro de residências. O próprio INPE possui um sistema de previsão de tempestades de raios, no entanto, tal sistema, embora aberto, não é divulgado e requer um conhecimento de meteorologia de quem acessá-lo, além de requisitar uma conexão à rede, o que limita ainda mais o acesso.

A partir disso, foi pensado um sistema de funcionamento que poderia ser mais acessível e instalado com baixo custo. Este artigo descreve o funcionamento do sistema pensado e as variáveis influentes na sensibilidade de detecção, assim como futuras investigações que possibilitam o uso do sistema desenvolvido em campo aberto.

 

OBJETIVO E QUESTÃO PROBLEMA

Como apresentado, o Brasil é um país com enorme incidência de raios. Destes, ocorrem diversos acidentes, vários dos quais são fatais, e dado tal fato, surgiu a ideia da criação de um novo sistema de detecção de raios.

A partir da teoria sobre raios, percebeu-se que para a detecção do forte campo eletrostático gerado por uma nuvem , que é quantificado em cerca de 10 kV/m, carregada poderia ser utilizado um eletroscópio. Além disso, com a ocorrência da descarga elétrica, ondas eletromagnéticas são emitidas em um intervalo de frequências de 2 kHz até cerca de 450 kHz, ou seja, em um intervalo de ondas médias até ondas longas. Tais ondas são facilmente percebidas a partir do uso de um rádio AM durante um período com incidência de raios, pois a onda soará como um estalo em meio à transmissão. O fenômeno é ainda mais perceptível se o rádio for deixado fora de sintonia com as estações locais, pois o estalo/chiado será mais nitidamente emitido, sem sobreposição com a voz ou música que estaria sendo reproduzida em determinada sintonia.

A partir de tais teorias, foi idealizado um sistema de detecção baseado em dois módulos, eletroscópio e rádio AM, e dependendo do sinal resultante de cada módulo, seria efetivada a detecção dos raios, e poderia ser emitido um sinal para as pessoas do local afetado evacuarem e buscarem abrigo seguro.

Para a avaliação de cada sinal foi utilizado um circuito integrado CMOS 4093, o qual trabalha com portas lógicas, assim permitindo a interpretação da resposta de cada módulo na detecção final.

 

DESCRIÇÃO DE MATERIAIS E MÉTODOS

Foram utilizados para a confecção do detector um rádio AM portátil, um circuito integrado CMOS 4093, e diversos componentes e peças como:

Transformador;

Capacitor 1 nF;

Resistores 10 kohms e 1 kohms;

Fios de fone de ouvido;

Matriz de contato de 550 pontos;

Fonte 6V;

Fios rígidos;

LED;

Antena (fio rígido);

 

Todos os quais seriam montados sobre a matriz de contato. O transformador foi utilizado para amplificar o impulso elétrico do estalo produzido no rádio a partir das ondas médias.

 

Diagrama 1: Aspecto do circuito
Diagrama 1: Aspecto do circuito

 

 

O rádio faz uso conjunto do eletroscópio de uma porta do circuito integrado. O eletroscópio, por sua vez, se utiliza de duas portas lógicas com funções inversoras antes de se combinar com o rádio AM.

Isso é possível pois o CMOS 4093 funciona a partir da seguinte tabela verdade:

 

 Tabela Verdade do 4093
Tabela Verdade do 4093

 

Cada sinal 1 equivale a um sinal positivo vindo por uma entrada, e cada sinal 0 equivale a um sinal negativo vindo de uma entrada, sendo que a partir das permutações das opções, tem-se que a única maneira de obtenção de um sinal negativo seria a entrada de dois sinais positivos. Assim, o LED do circuito apagaria somente quando o sinal vindo de ambos eletroscópio e rádio fosse positivo, criando a situação única na qual a detecção se efetivaria.

Por questões de limitação no tempo e dependência de condições climáticas, foi pensado um dispositivo de simulação que pudesse criar ondas eletromagnéticas a partir de uma descarga elétrica e também emitir um campo eletrostático forte o suficiente para detecção do eletroscópio.

O dispositivo concebido foi primeiramente um ionizador junto de um gerador de MAT (muito alta tensão), que estão apresentados nas figuras a seguir:

 

Ionizador usado para simular nuvem carregada.
Ionizador usado para simular nuvem carregada.

 

 

Gerador de MAT usado para descargas.
Gerador de MAT usado para descargas.

 

A utilização de ambos se mostrou efetiva na simulação do fenômeno de uma tempestade de raios. Nenhum risco era apresentado aos operadores, visto que embora uma descarga de 5000 V ocorresse, o gerador utilizava um flyback que isolava os operadores da rede elétrica, e o SCR contido no circuito do gerador de MAT limitava a corrente. Assim, embora um choque pudesse ser levado, ele não apresentaria nenhum perigo, embora um desconforto fosse sentido por alguns instantes.

Posteriormente, seria instalado no gerador de MAT um capacitor de lâminas de alumínio para que não houvesse necessidade do ionizador. Um fio ligado a tal capacitor permitiria que o campo eletrostático fosse emitido da mesma maneira que o ionizador faria. Assim, o método de simulação foi em suma o gerador de MAT.

Para os testes em laboratório, foram analisadas as condições de detecção em função do comprimento da antena (representando a sensibilidade do detector), além da própria funcionalidade do sistema proposto. Também foram feitos testes individuais de cada módulo, para o eletroscópio e para o rádio.

Além de testes em laboratório, foram feitos alguns testes durante tempestades reais, que permitiram que novas análises fossem feitas sobre o projeto e o advento de novas melhorias para que o sistema pudesse ser usado em campo aberto.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Dos testes em laboratório, foi obtido que o sistema de detecção funciona e é efetivo. As tentativas de averiguar o funcionamento individual de cada módulo também foram positivas, sendo que em todos os testes o rádio emitia o chiado necessário e o eletroscópio demonstrava a detecção do campo eletrostático emitido por ambos gerador de MAT e ionizador.

Além disso, foi averiguada a distância máxima de detecção em função do comprimento da antena, que está indicada no gráfico a seguir:

 

 

Detecção das descargas em função do comprimento da antena.
Detecção das descargas em função do comprimento da antena.

 

 

O comprimento das antenas sendo variado mostrou que a sensibilidade da antena utilizada é um fator extremamente relevante e decisivo na funcionalidade do protótipo. Isso permitiu que fossem feitas considerações em relação a mudanças futuras para uso do sistema em campo aberto.

A detecção se demonstrava efetiva pelo fato do LED piscar momentâneamente. Isso indica que o impulso positivo do rádio AM juntamente da detecção do campo elétrico se uniam em uma porta lógica e resultavam no sinal negativo que fazia o LED apagar.

Para testes durante tempestades, foi deixado o protótipo em uma mesa, não próxima do meio exterior, para que não houvesse danos causados por uma descarga elétrica próxima ou pela umidade e água da chuva.

 

Os resultados em geral foram positivos, embora ressalvas possam ser feitas no âmbito dos testes durante tempestades reais. Os testes em laboratório foram todos positivos, e a repetibilidade foi atestada para o protótipo em testes com os simuladores apresentados.

No quesito de tempestades reais, em dois casos foram possíveis a detecção das descargas, mas nos diversos outros testes não foi aferida a descarga elétrica (embora esta ocorresse). A causa de tal foi provavelmente a falta de sensibilidade da antena, que não conseguia detectar o campo elétrico. No entanto, para uso em campo aberto, foram feitas considerações em relação aos novos materiais que podem ser utilizados. Tais seriam a utilização de uma antena mais sensível ao campo eletrostático (mostra-se pelo gráfico 1 que o comportamento da distância de detecção em relação ao comprimento da antena é crescente, como é indicado pela reta média), assim como um detector de ondas longas, pois com estas, o som emitido deixa de ser um estalo, como nas ondas médias, para soar como um assobio longo, havendo então um impulso contínuo.

 

 

 

CONCLUSÕES

A partir dos diversos experimentos, conclui-se que o sistema de detecção proposto e o princípio de funcionamento são inovadores e exercem devidamente a função de detecção das descargas elétricas. No entanto, ainda são necessárias algumas melhorias para a utilização do detector em campo real. Tais modificações seriam a utilização de um detector de ondas longas em vez de um detector de ondas médias, pois as ondas longas são mais facilmente detectáveis. Também seria necessária a utilização de uma antena de maior sensibilidade, para que o campo eletrostático pudesse ser detectado com maior facilidade e precisão. Por fim, da instalação após feitas as modificações citadas, seria necessário um meio de proteção contra descargas elétricas para não haver danos ao aparelho na ocasião de uma destas.

Conclui-se que, apesar de o projeto não estar pronto para utilização em campo aberto, o sistema de detecção, assim como o princípio de funcionamento propostos funcionam e abrem diversas oportunidades para pesquisa e desenvolvimento sobre o dito princípio.

 

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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