Escrito por: Newton C. Braga

 Fontes de alimentação para a maioria das aplicações eletrônicas exigem que a tensão da rede de energia seja abaixada de modo a se obter um valor mais apropriado para os circuitos alimentados. Isso normalmente é feito através de um transformador, que é um componente caro e pesado. O que talvez muitos leitores não saibam é que existem alternativas para o uso do transformador, assunto justamente desse artigo.

Obs: Leia também  o artigo Projetando e Montando Fontes Sem Transformador (ART009), disponível neste site.

As FASTs (Fontes de Alimentação Sem Transformadores) são ideais para as aplicações em que o isolamento da rede de energia não é fator importante no projeto. Isso vai ocorrer nos casos em que o aparelho está totalmente encerrado numa caixa de material isolante, sem o perigo de um contacto direto com qualquer parte energizada.Essas fontes também são interessantes para o caso de alimentação de aparelhos de baixo consumo, onde os componentes alternativos, conforme veremos são pequenos e baratos. Para as aplicações em que o consumo é alto, a tecnologia não se aplica de modo simples.Os componentes alternativos, nesse caso, podem ser grandes e pesados e além disso, entra em jogo um fator adicional muito importante que é a segurança.



Uma fonte convencional
Numa fonte convencional analógica, o que temos é um transformador que abaixa a tensão da rede de energia e ao mesmo funciona como elemento de isolamento, conforme mostra a figura 1.

 Figura 1 – Diagrama de blocos de uma fonte de alimentação linear comum com  transformador.

Depois desse transformador temos as etapas de retificação e filtragem, eventualmente seguida por um circuito regulador de tensão. O problema básico dessa arquitetura está no transformador que é um componente pesado e caro. Tanto maior e mais pesado será o transformador quanto maior for a potência exigida pelo circuito alimentado, ou seja, o produto da tensão pela corrente. Na figura 2 temos alguns exemplos de transformadores usados normalmente na alimentação de circuitos de 5 a 30 V com correntes na faixa de 50 mA a 10 A.



Figura 2 – Transformadores comuns utilizados em fontes de alimentação.
                    
Esses transformadores são formados por pesados núcleos laminados de ferro em torno do qual são enroladas as bobinas que formam o primário e o secundário, eventualmente até mais enrolamentos.

Como Substituir o Transformador?
Uma idéia inicial consiste em se fazer um divisor resistivo, de modo que a tensão da rede fique reduzida e depois disso, possa ser retificada e filtrada, conforme mostra a figura 3.



Figura 3 – Obtendo 6 V com um divisor resistivo.

No entanto, essa configuração tem vários problemas sérios. O primeiro deles, é que o resistor R1, normalmente por ser bem maior que R2, dependendo da corrente exigida pela carga, deve ter uma dissipação bastante alta. Mesmo para uma fonte de poucas dezenas de miliampères, alimentada numa rede de 110/220 V, esse resistor deve ter vários watts de dissipação. Além do tamanho que ele representa, temos o problema adicional do aquecimento e do desperdício de energia, inadmissível em nossos dias.

O outro problema é mais grave. A tensão no divisor não depende apenas da relação de valor entre os resistores que o formam, mas também do consumo da carga. Assim, quando a carga é ligada, ela representa a conexão de um resistor adicional em paralelo que consome energia e que, portanto faz com que a tensão caia, conforme mostra a figura 4.



Figura 4 – A tensão cai quando a corrente de carga aumenta.

Uma fonte desse tipo deve então ser projetada para ter uma tensão bem mais alta e com a carga alimentada, cair para o valor desejado.
Um diodo zener ou um circuito regulador é portanto fundamental para esse tipo de configuração.



Usando Capacitores
Uma alternativa interessante para o uso de R1 numa fonte sem transformador, consiste em se aproveitar a reatância capacitiva de um capacitor. Um capacitor apresenta uma impedância (medida em ohms) que depende de seu valor e da freqüência do sinal que está sendo aplicado a ele. Podemos dizer de uma forma mais simples que um capacitor se comporta como um “ resistor para corrente alternada” , conforme mostra a figura 5.



Figura 5 – Um capacitor de 470 nF comporta-se como um resistor de 5k5 ohms num circuito de corrente alternada de 60 Hz.

Essa impedância pode ser facilmente calculada pela fórmula;

Zc = 2 x ? x f x C


Onde:
Zc é a reatância apresentada pelo capacitor em ohms
? = constante = 3,14
f é a freqüência da corrente em hertz
C é a capacitância do capacitor em farads

Veja então que podemos ligar um capacitor em série com um resistor de modo a obter um divisor de tensão que funcionará normalmente com tensões alternadas. Qual é a vantagem dessa configuração?

A primeira está no fato de que o capacitor não dissipa potência na forma de calor quando opera nesse divisor. Ele opera pela carga e descarga, não tendo portanto elementos resistivos para gerar calor.

Em outras palavras, não existe perda de energia nesse componente, o que faz com que além de não haver desperdício ele não trabalha quente. Na prática, existe uma pequena perda, isso porque nenhum capacitor é perfeito, mas ela é muito pequena. As desvantagens existem é claro. Uma delas está no fato de que o capacitor deve ser tanto maior quanto maior for a corrente desejada para alimentar a carga. A corrente depende da reatância numa razão inversa. Maior a corrente, menor a reatância e menor a reatância implica em maior capacitância. A outra desvantagem está no fato de que os capacitores para essa aplicação precisam ter tensões de isolamento elevadas e isso significa capacitores de construção especial e são tanto mais caros quanto maior for sua capacitância. Esses fatores limitam o uso dessa arquitetura á pequenas fontes que não devam fornecer mais do que uns 100 mA sob tensões na faixa de poucos volts até perto de 30 ou 40 V.


A Configuração
Uma configuração básica para uma fonte desse tipo é então mostrada na figura 6.



Figura 6 – Configuração básica para alimentar uma carga de corrente alternada com 6 V a partir de 110 V de entrada.

A partir dela, vamos ensinar o leitor a calcular os componentes que devem ser usados e chegar a um projeto prático. Para isso vamos supor que desejamos alimentar uma pequena lâmpada de 6 V com uma corrente da ordem de 20 mA. Nosso primeiro passo consiste em se calcular qual é a reatância que deve apresentar o capacitor para formar um divisor conforme mostra a figura 7.



Figura 7 – Valores utilizados nos cálculos.

Nesse problema temos:
V = 6 V
Vin = 110 V
I = 0,02 A (20 mA)
F = 60 Hz
C = ?

Começamos por determinar qual é a resistência que a carga (lâmpada) apresenta, quando alimentada por uma tensão de 6 V e percorrida por uma corrente de 20 mA.

R = V/I

V = 6 V
I = 0,02 A (20 mA)

R = 6/0,02
R = 300 ohms

A seguir, determinamos a impedância que o circuito todo deve ter quando fornecendo 0,02 A em 110 V:

Z = 110/0,02
Z = 5 500 ohms

A partir daí podemos calcular a reatância capacitiva que o circuito deve apresentar, a qual é dada pela fórmula e cálculos a seguir:



 

A reatância capacitiva do capacitor deve ser 5 500 ohms. Na rede de 110 V x 60 Hz, ela corresponde a um capacitor de:




Um capacitor de 470 nF atenderá às nossas necessidades. A tensão de pico na rede de 110 V é de:

Vp = 110 x 1,41 = 155,1 V

Isso significa que deve ser usado um capacitor de poliéster com pelo menos 200 V de tensão de trabalho.  Como a tensão nesse tipo de divisor varia conforme a corrente na carga, poderemos adicionar uma etapa reguladora, usando um diodo zener. A tensão será de 6 V e a dissipação será dada pela corrente máxima que circula pelo circuito regulador quando na ausência da carga, da ordem de 0,02 a (20 mA). Na figura 8 mostramos como agregar esse diodo.



Figura 8 – Circuito final com regulagem por diodo zener para correntes até 20 mA.

Assim, nessa condição, a potência dissipada no diodo será:

P =6 x 0,02 = 0,12 W ou 120 mW

Dando uma tolerância, para que o diodo não aqueça demais, quando não houver carga a ser alimentada, podemos usar um tipo de 400 mW ou mesmo 500 mW.



Conclusão
Fontes sem transformador consistem numa excelente alternativa para a alimentação de aparelhos de baixo consumo a partir da rede de energia. No entanto, é preciso ter muito cuidado com o seu isolamento, pois o aparelho alimentado estará conectado diretamente à rede. Da mesma forma, as limitações do capacitor impedem que esse tipo de fonte seja usada para alimentar aparelhos que tenham consumo de mais de 100 mA tipicamente.