O multímetro não é só um instrumento de utilidade na oficina de eletrônica. Os mecânicos de automóvel e, principalmente, os que mexem com a parte elétrica de veículos podem ter neste instrumento um eficiente auxiliar. Entretanto, para que o multímetro possa ser útil, é preciso saber como. Neste artigo damos algumas “dicas” sobre o uso do multímetro na verificação da parte elétrica de veículos.

Obs. O artigo é de 1986. Para saber mais sobre o uso do multímetro, sugerimos nosso livro “Os Segredos no Uso do Multímetro”.

 

O multímetro é, sem dúvida, o aparelho de maior utilidade na oficina de eletrônica. Todos os técnicos reparadores devem possuí-lo, dada sua capacidade de medir tensões, correntes e resistências e com isso verificar circuitos e componentes.

O que talvez muitos de nossos leitores não saibam, é que o multímetro também é um instrumento eficiente no teste de componentes da parte elétrica de veículos e até mesmo na verificação da fiação.

Um multímetro comum, 10 000 Ω por volt ou mais, deve estar presente em todas as oficinas mecânicas e de eletricidade de automóvel, principalmente se levarmos em conta a difusão cada vez maior de dispositivos eletrônicos nos veículos, como ignições, alarmes, etc.

 

Obs. Na época em que o artigo foi escrito os multímetros digitais eram caros e pouco comuns, mas hoje, com a maior facilidade de acesso, podem ser usados nos testes que descrevemos.

 

Neste artigo, o que daremos será uma primeira introdução ao uso do multímetro no carro, dedicada principalmente aos mecânicos com “vocação" para a eletrônica. Futuramente voltaremos ao assunto com artigos cada vez mais avançados, levando aos leitores também a parte eletrônica propriamente dos veículos.

Obs. Veja também nosso livro Curso de Eletrônica – Eletrônica Automotiva para saber mais.

 

Que multímetro usar e quais os cuidados

Qualquer multímetro comum de 10 000 Ω por volt, e até menos, com escalas de tensão contínua (DC), corrente contínua (DC) e resistências (Ω), pode ser usado no carro.

Entretanto, é preciso lembrar que o multímetro é um instrumento delicado e que, se indevidamente usado, pode facilmente ser inutilizado.

Se tentarmos medir corrente onde houver tensão, o resultado será desastroso: a queima de diversos componentes e, se um deles for o instrumento indicador, o custo de reparo será muito alto, senão motivo de abandono do aparelho!

 

1. Teste de bateria

O melhor teste de bateria é feito com carga. Normalmente, o que se faz é curto-circuitar a bateria e verificar se algum elemento ferve.

No entanto, com o multímetro podemos facilmente verificar o estado de uma bateria pela sua tensão.

Para isso, conforme mostra a figura 1, usamos o multímetro numa escala de tensões que permita ler até15 V (0 -15V DC VOLTS), por exemplo.

 

Figura 1 – Teste de bateria
Figura 1 – Teste de bateria

 

Uma bateria em boas condições, totalmente carregada, pode apresentar tensões na faixa de 13,2 a 13,8 volts.

Uma bateria ainda em condições de operação, mas enfraquecida, pode ter tensões entre 10,5 e 13,2 Volts.

Abaixo dos 10,5 V a bateria estará descarregada.

Cada célula da bateria tem uma tensão de 2,2 Volts, tipicamente, conforme sugere a figura 2.

 

Figura 2 – Tensão de cada célula
Figura 2 – Tensão de cada célula

 

Com o multímetro podemos fazer sua verificação, se suas ligações forem acessíveis (na maioria das baterias modernas, isso não será possível).

Para baterias de 6 V basta dividir os valores por 2, para obter as faixas de estado.

 

2. Teste de fusíveis e lâmpadas

Nem sempre o exame visual permite saber se um fusível ou lâmpada estão queimados. Numa lâmpada, a interrupção do filamento pode ser imperceptível, o mesmo ocorrendo em relação ao elemento interno de um fusível.

Podemos testar estes dispositivos usando o multímetro na escala mais baixa de resistências (DC Ω X1ou DC Ω X10).

Para isso, devemos fazer a prova do elemento fora do circuito, conforme mostra a figura 3.

 

Figura 3 – Teste de fusíveis e lâmpadas
Figura 3 – Teste de fusíveis e lâmpadas

 

Se a lâmpada ou fusível estiverem em bom estado, a agulha deve movimentar-se para a direita, indo próximo de zero para o fusível ou entre 4 Ω e 100 Ω (para a lâmpada).

Se a lâmpada ou fusível estiverem queimados (abertos), a agulha do instrumento não se moverá (indicará infinito).

 

3. Teste do sistema indicador de combustível

Na figura 4 temos o diagrama do sistema mais comum de indicação do níveI de combustível.

 

Figura 4 – Indicador de combustível
Figura 4 – Indicador de combustível

 

 

Ligado em série com um instrumento indicador, existe um dispositivo sensor, que nada mais é do que um resistor variável acoplado a uma boia dentro do tanque.

Um dos polos do resistor é ligado ao chassi e o outro vai ao instrumento indicador, dosando a corrente que passa por ele. Em função da corrente será a indicação.

Dois problemas podem ocorrer com este sistema: interrupção do sensor ou então interrupção (ou problemas mecânicos) do instrumento indicador.

Temos diversas possibilidades de uso para o multímetro na prova deste sistema:

a) Prova do sensor: desligando o fio que vai ao instrumento e ligando as pontas de prova do multímetro na escala mais baixa de resistência (DC Ω X1 ou DC Ω X10), devemos ler um valor baixo quando o sensor estiver bom.

Movimentando a boia, deve haver uma movimentação da agulha. (figura 5)

 

Figura 5 – Teste mecânico da boia
Figura 5 – Teste mecânico da boia

 

A agulha não deve dar “saltos", pois isso indica interrupções do sensor (uma interrupção do sensor faz com que, repentinamente, indicando por exemplo 3/4 do combustível, a agulha caia para zero).

Se a indicação for de infinito, ou seja, a agulha não mexer, o elemento sensor está ruim.

b) Prova do instrumento: para este, basta ligar momentaneamente o fio retirado da boia ao chassi.

A indicação deve ser de “tanque cheio". Se nada acontecer, a agulha não se mover, verifique se no ponto X do circuito da figura 6 existe tensão.

 

Figura 6 – Verificando a tensão no ponto X
Figura 6 – Verificando a tensão no ponto X

 

Esta tensão deve ficar entre 5 e 12 Volts (ou 13,2 V). Se a tensão for nula, verifique os fusíveis do sistema, pois o problema não está no indicador.

Se existir tensão normal, então o problema realmente é do instrumento.

Obs. Na época em que o artigo foi feito não existiam os indicadores digitais que têm um procedimento de análise completamente diferente. Vale, entretanto, para os carros antigos.

 

4. Prova do sistema de ignição

Na figura 7 temos o circuito típico de um sistema de ignição convencional (não eletrônica).

 

Figura 7 – Sistema convencional de ignição
Figura 7 – Sistema convencional de ignição

 

O movimento do motor faz com que o platinado abra e feche, interrompendo a corrente no primário da bobina de ignição, de modo a gerar uma alta tensão no secundário, responsável pelas faíscas nas velas, as quais provocam a explosão do combustível no cilindro.

Os pontos críticos deste sistema são: o platinado, o capacitor (condensador) que vai junto ao platinado, a bobina e o sistema distribuidor com as velas.

Alguns testes simples com o multímetro podem ser úteis na descoberta de problemas:

a) O platinado, ao ser fechado, deve apresentar uma resistência muito baixa, de modo que uma corrente intensa possa fluir pela bobina. Com o tempo, uma capa de óxido se forma pela ação da faísca e o platinado não mais apresenta esta baixa resistência.

Com a ignição ligada e o platinado fechado, a tensão entre os pontos indicados na figura 8 deve ser muito baixa, inferior a 0,1 Volt para um platinado em bom estado.

 

Figura 8 – teste do platinado
Figura 8 – teste do platinado

 

Uma tensão anormalmente alta indica um platinado ruim.

Este teste deve ser feito rapidamente, para não haver aquecimento da bobina pela intensa corrente que flui.

b) O capacitor pode ser testado na escala mais alta de resistência (Ω X1k ou Ω X10 k).

Encostando as pontas de prova em seus terminais, conforme a figura 9 deve haver uma ligeira movimentação da agulha, que em seguida volta ao infinito.

 

Figura 9 – Teste do capacitor
Figura 9 – Teste do capacitor

 

Se a agulha não se mover, o capacitor está aberto e se a agulha indicar uma resistência baixa (menor que 10 M), ou seja, o ponteiro não voltar ao infinito, o capacitor deve ser trocado, pois está em curto ou com fuga, ou ainda aberto.

c) O teste da bobina é feito com o sistema de ignição desligado, conforme mostra a figura 10.

 

Figura 10 – Teste da bobina
Figura 10 – Teste da bobina

 

O multímetro deve estar na escala Ω X1 e na medida do enrolamento primário deve ser lida uma resistência muito baixa (1 a 5 Ω).

No enrolamento de alta tensão, 1 000 a 10 000 Ω de resistência deve ser lido na escala de resistência Ω X100.

Se a resistência lida for infinito, o enrolamento se encontra aberto.

Este teste não revela a existência de curto-circuitos entre espiras no enrolamento, que pode ser a causa de aquecimento e não funcionamento da bobina.