União da eletrônica, mecatrônica com a biologia.

Quando observamos um helicóptero em vôo e admiramos a engenhosidade dos homens que criaram tal equipamento não nos damos conta de que a natureza já tinha resolvido o problema da parada no ar há milhões de anos com simples insetos como a libélula e posteriormente com o beija-flor.

Da mesma forma quando aplaudimos a engenhosidade dos homens que criaram o radar não percebemos que este equipamento foi totalmente inspirado nos morcegos que já tinham a solução para seu uso milhäes da anos antes, dadas pela natureza.

Estes dispositivos e equipamentos que se inspiram em soluções dadas pela natureza são fruto de uma ciência muito importante que é a biônica.

A eletrônica e mecânica quando unidas resultam na mecatrônica e a mecatrônica quando unida à biologia pode criar soluções muito interessantes para problemas tecnológicos que merecem ser analisadas.

 

O RADAR E O SONAR

A idéia de se usar sons e ondas de rádio para detectar objetos já é utilizada pela natureza há milhões de anos, e no nosso artigo "Como Funciona o Radar" publicado outro artigo, tivemos oportunidade de detalhar como isso ocorre.

No entanto, o uso da eletricidade pela natureza para detecção de objetos vai além e existem soluções muito interessantes que podem ser aproveitadas pela nossa tecnologia.

Existe um peixe, denominado Ituí Cavalo (cujo nome científico é Apteronotus Albifrons da família dos Gymnotoidae) e que vive em rios de águas esuras da amazonia é capaz de utilizar campos elétricos de baixa frequência para detectar objetos a sua volta e mesmo outros animais.

Este peixe, conforme mostra a figura 1, possui um órgão gerador de eletricidade, do tipo semelhante aos usados pelos peixes elétricos, e que produz um campo de corrente de alguns volts em torno do animal.

 

Ituí-Cavalo – peixe que gera um campo elétrico para a orientação.
Ituí-Cavalo – peixe que gera um campo elétrico para a orientação.

 

 

A frequência deste campo, que varia de 400 Hz a 2 000 Hz, dependendo do peixe, eé tão estável, que já se utilizou este animal para gerar os pulsos de sincronismo que alimentam um relógio conforme mostra a figura 2.

 

Sincronizando um relógio com o Ituí-cavalo.
Sincronizando um relógio com o Ituí-cavalo.

 

 

O que ocorre é que, ao lado do órgão emissor, o peixe tem órgãos sensores que permitem ao animal fazer uma "imagem mental" do que está a sua volta pelas deformações que as linhas do campo de corrente sofrem pela presença de objetos menos condutores ou mais condutores a sua volta.

Já publicamos em outros artigos e livros o modo de se "ouvir" o campo de corrente deste peixe (que pode ser encontrados em casas de peixes ornamentais mesmo de São Paulo) ou de se observar a forma de onda do sinal emitido num osciloscópio.

Basta colocar no aquário em que se encontra o animal dois eletrodos e ligá-los à entrada de um bom amplificador de áudio ou de um osciloscópio, conforme mostra a figura 3.

 

Usando campos magnéticos num sistema de orientação para cegos.
Usando campos magnéticos num sistema de orientação para cegos.

 

 

 

O sinal, com amplitude que pode passar de 2 volts ‚ facilmente captado e excita qualquer circuito com facilidade.

A biônica, observando formas de vida como esta, com soluções interessantes para o problema da orientação em guas turvas pode criar o equivalente eletrônico ou mecatrônico para a orientação humana e mesmo de robôs.

Uma possibilidade interessante consiste em se usar campos magnéticos criados por bobinas e sensores apropriados num circuito de processamento num equipamento de ajuda para cegos.

Os pequenos objetos metálicos que as pessoas carregam ou mesmo as propriedades diamagnéticas de objetos podem causar deformações no campo que seriam detectadas e processadas pelo circuito informando o cego quer seja por meio de sinais auditivos quer seja por est¡mulos diretos ao cérebro.

 

Inspirados nesta mesma idéia podemos sugerir o desenvolvimento de equipamentos de estacionamento ou detecção de colisão para automóveiso ou orientação para robôs móveis.

 

A MOVIMENTAÇÃO HIDRÁULICA DA ARANHA

A robótica como ramo da mecatrônica esta numa fase de desenvolvimento espantosa e a cada dia vemos os mais estranhos "seres mecânicos" em demonstração com sistemas de propulsão que realmente deixam-nos pasmos diante da capacidade de imaginação de seus criadores.

No entanto, a natureza, através da biônica, pode servir de inspiração para a tecnologia a ser usada na movimentação de robôs.

A natureza nunca utilizou a roda como solução de movimento para nenhum dos seres vivos que conhecemos. No entanto, as soluções hidráulicas foram aproveitadas e de uma forma muito interessante.

Existe uma espécie de aranha que se movimenta graças à sua hipertensão arterial!

Nas juntas das pernas desta aranha existem pequenas bolsas que, ao se expandirem fazem com que as pernas se movimentem no sentido necessário ao movimento, conforme mostra a figura 4.

 

O sistema hidráulico de movimento de uma aranha.
O sistema hidráulico de movimento de uma aranha.

 

 

Quando esta aranha deseja saltar, e o cérebro envia ao sistema de propulsão do inseto este comando o que ocorre é que a pressão sanguínea do inseto aumenta enormemente injetando com pressão líquido nas bolsas das articulações. Com a rapidissima expansão as bolsas incham e a perna da aranha se movimenta no sentido de fazê-la saltar.

No interessante livro do autor russo I. Mirov (La Bionique – Edições EM de Moscou de 1970) o autor descreve em pormenores como se descobriu a propulsão hidráulica da aranha e sugere como ele poderia ser usada em robôs ou mesmo em veículos "saltadores".

 

O GIROSCÓPIO DA LIBÉLULA

Um dos problemas mais intrigantes do vôo dos insetos é a capacidade deste animais tão pequenos poderem manter sua estabilidade.

Nos aviões modernos usamos os giroscópios tanto para manter sua rota como também para evitar movimentos laterais que poderiam tornar desconfortável a viagem para os passageiros (os aviäes usam dois giroscópios).

Como a natureza não faz uso da roda na maioria de suas soluções o giroscópio na forma tradicional do disco suspenso em um sistema cardânico não pode ser encontrado nos seres vivos.

 

O sistema cardânico do giroscópio.
O sistema cardânico do giroscópio.

 

 

Assim, a solução encontrada pela natureza e que também já é aproveitada pelo homem em alguns tipos de sensores é o do conjunto de lâminas vibrantes.

Em certos insetos, como a libélula, foram encontrados câmaras contendo cílios que vibrando de forma muito rápida apresentam o mesmo comportamento do disco que gira de um giroscópio, ou seja, uma inércia muito grande a qualquer tentativa de se modificar a direção de suas oscilações.

 

A força que surge com as mudanças de direção é percebida por órgãos sensores apropriados e enviada ao cérebro na forma de impulsos que permitem ao animal corrigir ou manter sua rota.

 

REDES NEURAIS

A solução dada pelo homem no desenvolvimento dos computadores modernos não é baseada na natureza. A natureza, para processar informações criou os neurônios, aglomerando-os posteriormente no que se denomina de um sistema nervoso central com um ponto máximo que é o cérebro.

Nenhum inseto ou animal usa lógica digital ou coisa semelhante como ferramenta de processamento de informações ou tomada de decisões em lugar do cérebro.

No entanto, o homem pode estar agora se aproximando mais da natureza, com a adoção de processadores que podem usar as mesmas soluções adotadas pela natureza, ou seja, baseadas no comportamento elétrico do neurônio (figura 6).

 

O neurônio-elemento básico dos sistemas inteligentes.
O neurônio-elemento básico dos sistemas inteligentes.

 

 

Diferentemente dos flip-flops e portas lógicas os neurônios possuem uma certa flexibilidade na resposta que dão aos impulsos que os estimulam, o que torna um sistema que os use muito mais facilmente integrável com as condições do ambiente em que ele opera, o que é uma exigência básica da natureza para a questão da sobrevivência da espécie.

Utilizando circuitos baseados em neurônios artificiais, ou seja, montando-se redes neurais, pode-se ter um comportamento diferente dos processadores, muito mais próximo dos seres vivos.

Assim, com base na biônica estão sendo utilizadas redes neurais que nada mais são do circuitos que utilizam neurônios eletrônicos. Os neurônios eletrônicos nada mais são do que circuitos que têm o mesmo comportamento de um neurônio natural, conforme mostra a figura 7.

 

Neurônio tipo “integrate and fire” usando amplificadores opercionais.
Neurônio tipo “integrate and fire” usando amplificadores opercionais.

 

 

Além dos neurônios possuirem uma faixa passante de intensidades de impulso de estímulos que se desloca conforme o uso, o que permite ao neurônio se adaptar as condições de predominância de um tipo de estímulo num ambiente eles possuem uma característica de inibição.

Com intensidades de estímulo acima de um certo valor eles simplesmente deixam de operar, negando os estímulos de entrada.

Redes complexas formadas por estes neurônios têm levado os cientistas a descobrir que o aprendizado é possível e mesmo a tomada de decisões não programadas diante de certas condições de entrada. Isso leva a ciência a falar em inteligência artificial já que estas máquinas passam a ter as mesmas características dos seres vivos que damos o nome de inteligência.

Nos laboratórios das grandes universidades como a USP, UNICAMP, UNB, etc grupos de pesquisas que trabalham com redes neurais e inteligência artificial tem obtido resultados surpreendentes com equipamentos de uso prático.